Há vinte anos, um veículo fazia de 15 a 20 entregas por dia nas regiões metropolitanas do país. Hoje, com a restrição de circulação de veículos pesados nos centros expandidos, expansão da frota e dos congestionamentos, a mesma transportadora consegue fazer três ou quatro. Para contornar esse problema, as empresas têm investido em novas soluções de tecnologia, enquanto o governo acena com concessões de transporte, o que deve trazer novas oportunidades e ampliar a multimodalidade ao longo dos próximos anos.
O transporte de bens nos centros das grandes cidades ficou mais caro e exige uma frota de veículos com tamanhos diferentes. Levar rolos de 100 quilos de jeans para uma loja de confecção na região central de São Paulo, por exemplo, exige hoje uma ginástica. “As pequenas empresas não podem receber em horário noturno, porque não têm estrutura ou segurança para isso, então fazemos uma viagem logo no primeiro horário comercial e usamos um ou dois veículos mais leves”, afirma Celso Luchiari, diretor geral da Transportadora Americana (TA), que prevê receita de R$ 300 milhões em 2014, mesmo patamar do ano passado.
Para ser mais competitiva, a operadora tem feito testes na entrega de eletroeletrônicos com navegação de cabotagem na rota Manaus-São Paulo. “É uma alternativa que estamos olhando.”
A empresa, que também tem investido em aumento da automatização dos seus processos, é uma das participantes do programa Brasil ID, desenvolvido pelo governo para acelerar o trâmite de mercadorias no país. Hoje os caminhões que circulam pelo país têm de parar em postos fiscais espalhados pelas estradas para apresentar os documentos fiscais das cargas. A iniciativa pioneira se baseia no uso de chips que levam a informação on-line para a Receita Federal. Bem-sucedido, o projeto deve ganhar escala. “Chegamos a parar um ou dois dias em alguns postos, mas isso traz celeridade”, diz Luchiari.
Maior operadora logística rodoviária do país, a JSL prevê crescimento da receita este ano, com os clientes de olho em revisar custos e buscar cada vez mais a terceirização de suas operações. Ganhar mercado pressupõe ter serviços diferenciados e uma automatização maior dos processos.
Na área de mineração, a JSL oferece a instalação de sensores em ônibus que levam trabalhadores a uma mina. Com os equipamentos, permite-se avaliar tempo do percurso, rotação do motor, consumo de combustível e freadas. Para laboratórios de análises clínicas, oferece-se serviço para levar enfermeiros para a casa de pacientes, com a gestão da informação de horário de chegadas e saídas. “A tecnologia de ponta é customizada”, afirma Fernando Simões, presidente da JSL.
Não são apenas os operadores logísticos que traçam suas estratégias. Uma das maiores hidrelétricas do mundo, Belo Monte está sendo construída em plena Floresta Amazônica. Ali o período úmido, que vai de novembro a abril, costuma ser um complicador, principalmente por afetar o transporte de peças e equipamentos por estradas. Uma saída encontrada pelo consórcio Norte Energia foi a construção de um porto. “Sem isso, teríamos dificuldade para transportar peças e materiais no período chuvoso”, diz o diretor de fornecimento e montagem, Wellington Lopes Ferreira.
O transporte de alimentos é feito pela rodovia Transamazônica, mas, quando necessário, utiliza-se também o modal fluvial, a partir de uma base no porto de Belém. Os produtos são descarregados das carretas, identificados, separados de acordo com os destinos e dispostos em contêineres, transportados em balsas até o porto. Ali, caminhões fazem o traslado do material para o sítio correspondente.
Logística
“Apesar das dificuldades, muitas empresas estão investindo para minimizar os impactos, com frotas modernas, centros de distribuição em vários pontos e novas tecnologias”, diz Pedro Moreira Francisco, presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog), que está se articulando para a criação da Frente Nacional da Multimodalidade, que reunirá empresas e outras entidades. Uma das ideias é reduzir os custos incidentes sobre os operadores multimodais. “Em um operador que usa ferrovia, rodovia e cabotagem, poderia haver uma redução potencial de 9% a 18% com uma gestão mais eficaz de documentos e uma cobrança mais racional do ICMS nos Estados em que as cargas são originadas”, destaca o executivo.
O mercado de logística está mais maduro. O tempo médio de existência dos operadores logísticos passou de 7,3 anos, em 2001, para 14,7 anos em 2013. A receita média também está aumentando: chegou a R$ 49 bilhões em 2012, mais do que o dobro dos R$ 22 bilhões apurados em 2006, segundo dados mais recentes de pesquisa do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos). Já o número de participantes caiu: em 2012 eram 136, ante 165 em 2008, o que mostra a tendência de fusões e aquisições na área. Nos últimos anos, grandes negócios foram fechados: a venda do braço logístico da Femsa, engarrafadora da Coca-Cola, para a Expresso Jundiaí, e o ingresso da Fedex no Rapidão Cometa.
O espaço crescente de consolidação pode ser visto com outro dado: nos EUA, as cinco maiores transportadoras representam cerca de metade das compras de caminhões, enquanto, no Brasil, o maior operador responde por 2,5%.
Para o professor da Fundação Dom Cabral (FDC) Paulo Resende, essa dinâmica será regida no Brasil principalmente por dois fatores: escala e especialização. No primeiro caso, o movimento pode surgir entre operadores ou entre clientes e operadores, como o caso da Cosan, que adquiriu o controle da ALL. “Já algumas empresas, como a Fedex, buscaram adquirir empresas com conhecimento local do mercado, como a Rapidão Cometa, em uma aquisição que mescla uma operação local e global”, comenta.
A multimodalidade será uma tendência crescente no setor, com a expansão além do modal rodoviário. Principal financiador da infraestrutura nacional, o BNDES prevê aumento dos investimentos em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos financiados pelo banco. Neste ano, os desembolsos nas quatro áreas devem atingir R$ 10,35 bilhões, alta de quase 20% em relação a 2013.
O destaque devem ser as rodovias e aeroportos, com desembolsos de R$ 3,81 bilhões e R$ 2,62 bilhões, respectivamente. Para 2016, a previsão é de R$ 20,27 bilhões, as ferrovias respondendo por R$ 5,58 bilhões e as rodovias por R$ 7,35 bilhões. Isso poderá elevar a participação do setor nos desembolsos totais. No ano passado, logística representou 5% dos financiamentos.
“O programa de concessões do governo federal deverá ter um impacto positivo sobre os investimentos em infraestrutura, que devem somar R$ 170 bilhões em quatro anos”, afirma o gerente do departamento de logística do BNDES, Dalmo Marchetti.
Uma das expectativas é em relação ao novo modelo ferroviário, que, além de contemplar a construção de novos trechos, também cria uma nova figura: o operador independente, o que poderá criar uma nova demanda por crédito. “Podem surgir novos operadores e demanda para financiar frotas de vagões ou terminais de transbordo”, ressalta.
Os bancos privados também estão de olho na demanda a surgir. “Algumas das concessões rodoviárias já estão em fase de estruturação financeira dos empréstimos ponte”, avalia Rogerio Yamashita, responsável em project finance pela cobertura de infraestrutura no Itaú BBA. Uma parte dos investimentos poderá ser financiada pela emissão de debêntures de infraestrutura, criadas em 2011 pelo governo e que contam com vantagens fiscais para os investidores.
Fonte: Valor Econômico
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