Uma das principais formas de trabalho infantil, a exploração sexual é registrada com recorrência em postos de combustíveis e paradouros ao longo de rodovias gaúchas. Os dados, levantados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Estado, estão compilados no Observatório do Trabalho Infantil, lançado há pouco mais de um mês pelo Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), e mostram que o maior número de pontos está na BR-386, no trecho conhecido como Tabaí/Canoas. Os policiais ainda fazem um trabalho de conscientização com caminhoneiros, além de uma condução aos órgãos competentes das adolescentes envolvidas neste tipo de ocorrência.
Os dados do observatório servem de alerta e apontam a necessidade de se continuar discutindo e buscando a erradicação de qualquer tipo de exploração infantil. No Estado, os números da exploração sexual ainda são incipientes se comparados a outras unidades de Federação.
Para a procuradora do MPT-RS, Ana Lúcia Stumpf Gonsález, da Coordenadoria Regional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes (Coordinfância), os dados disponíveis auxiliam a entidade a planejar ações onde há mais necessidade. “O Observatório serve como norteador para políticas públicas, não só do Ministério Público, mas do Estado e de municípios que queiram se valer desses dados, por exemplo, verificando índices elevados de acidentes de trabalho envolvendo crianças ou adolescentes. Quando não se tem a estatística, a gente nem sabe da existência do problema”, explica Ana Lúcia.
Segundo o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, o Rio Grande do Sul apresentava 217,3 mil crianças e adolescentes entre dez e 17 anos exercendo algum tipo de trabalho. Entre esses menores, 39,7 mil tinham entre dez e 13 anos. Já em Porto Alegre havia 15,1 crianças e adolescentes entre dez e 17 anos em alguma ocupação, das quais 1,9 mil tinham entre dez e 13 anos.
Sobre os casos de exploração sexual, a procuradora aponta a necessidade de a população ajudar no enfrentamento do problema. “É importante contar com a colaboração das pessoas, de visualizar uma situação e reportar esses casos, porque muitas vezes as pessoas não enxergam que aquela exploração sexual, além de crime, está listada nas piores formas de trabalho infantil e precisa ser combatida”, ressalta.
Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro defendeu o trabalho infantil e usou o próprio exemplo para dizer que “não foi prejudicado em nada” por ter colhido milho aos nove, dez anos de idade. Bolsonaro declarou ainda que “o trabalho dignifica o homem e a mulher, não interessa a idade”, mas alertou que não apresentaria nenhum projeto de lei para descriminalizar a prática por saber que “seria massacrado”.
A partir dessas falas, a procuradora Ana Lúcia avalia “ser uma reprodução do senso comum”. Quem trabalha nessa área, está muito acostumado a ouvir esse tipo declaração, intitulada como “mitos do trabalho infantil”, repetida pelas pessoas, na maioria das vezes, sem pensar.
“O que é preciso fazer a partir destas frases prontas? Contrapor o senso comum com informação. As pessoas dizem: é melhor estar trabalhando do que estar na rua e virar marginal. O que elas não sabem é que quase a totalidade desses jovens que estão cumprindo medidas na Fundação de Atendimento Socioeducativa (Fase) são oriundos do trabalho infantil. Afinal, o tráfico de drogas é trabalho infantil. Por isso precisamos sempre combater esses mitos”, explica. “Claro que nos preocupa uma fala desse tipo ser reproduzida e ganhar ainda mais repercussão por conta de ser um chefe de Estado. Por outro lado, nos dá a oportunidade de contrapor com dados concretos, e o observatório é uma oportunidade de mostrar estes números.”
Denúncias podem ser feitas, de forma anônima, pelo site
www.mpt.mp.br, na aba de denúncias, ou através do aplicativo MPT Pardal, enviando fotografias.
O que é o Observatório do Trabalho Infantil? (smartlabbr.org/trabalhoinfantil/)
Serve para auxiliar na precisão de dados coletados das mais diversas entidades e órgãos. Índices de acidentes de trabalho, principais agentes causadores e atividades econômicas em que são mais frequentes estão disponíveis. O portal agrega dados coletados por Ministério da Educação, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Polícia Rodoviária Federal e pela própria fiscalização do Ministério Público do Trabalho, entre outros.
Deivison Ávila | Jornal do Comércio
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