Setembro Amarelo: Casos de suicídio aumentam entre jovens e crianças
Só no Brasil, mais de 14 mil ocorrências são registradas anualmente devido, principalmente, a falta de diagnóstico de doenças mentais
Redação Chico da Boleia
O mês de setembro é dedicado ao combate ao suicídio, ato que, nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais comum nos lares brasileiros. Dados da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) revelam que no país, anualmente são registrados 14 mil casos de suicídio e os episódios entre os mais jovens, incluindo crianças, não param de crescer. No mundo, os números podem ultrapassar um milhão de casos, nem sempre notificados. O índice é grave e serve de alerta para a importância do debate e da conscientização sobre os cuidados com a saúde mental.
Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatra, em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), divulgam informações relevantes sobre o tema por meio da campanha Setembro Amarelo, que visa principalmente promover a prevenção ao suicídio. O lema deste ano é “A vida é a melhor escolha”.
Porém, o que leva uma pessoa a cometer suicídio? De acordo com a professora Sônia Prado, coordenadora do curso de Psicologia da Estácio São Paulo, são diversos os motivos que levam alguém a considerar tal ato como sua melhor opção. “Pode ser por um processo emocional, social ou médico como o transtorno de ansiedade que leva à depressão e esse quadro depressivo pode deixar a pessoa com um sofrimento tão intenso que ela não consegue achar uma saída. Se vê sem apoio, sem encontrar um caminho possível, a única saída que encontra acaba sendo o suicídio”.
– Em geral, pode-se afirmar que cerca de 90% das pessoas que se suicidam possuem depressão ou algum outro transtorno associado, como abuso de drogas ou ansiedade, por exemplo. Não se pode afirmar que todas as pessoas com depressão tenham comportamento suicida – estima-se que sejam de 5% a 10%. Entretanto, a maior parte das pessoas que tentam ou cometem suicídio apresenta sintomas do transtorno – destaca a professora.
Ainda de acordo com Prado, a pessoa que tem pensamentos suicidas deixa vários sinais, antes de partir para execução do ato. E todos são quase sempre reconhecíveis e previsíveis. “Por isso, os esforços precisam ser feitos para identificarmos o quanto antes esses sinais, para poder oferecer ajuda e tratamento. Para tentar impedir o ato suicida”.
Alguns dos comportamentos ou sinais que podem chamar a atenção nas relações de convivência são:
– Transtorno de ansiedade, depressão, alcoolismo ou uso de outras drogas, quadro psicótico e estado de exaustão;
– Acontecimento traumático próximo como: término de relacionamento amoroso e luto;
– Melhora súbita do humor depressivo;
– Sentimento de desesperança, pessimismo, sentimento de inferioridade constante, autoestima baixa, sentimento de culpa;
– Mudança das condições de saúde ou estado físico: doença crônica, acidente com sequelas físicas;
– Disponibilidade dos meios para o suicídio (recursos e métodos violentos e letais à disposição: remédios, armas…);
– Ideação suicida verbalizada aos parentes ou amigos;
– Conflitos ou insegurança com a sexualidade: homossexualidade, impotência sexual, entre outros.
A especialista reforça que as tentativas e os atos suicidas são gritos de ajuda. Ainda que inconscientemente, as pessoas choram por socorro ao emitir todos os sinais que prenunciam os planejamentos ou ideias de tirar a própria vida. “O grande prejuízo em tudo isso é que muitas pessoas na nossa cultura costumam rotular esses sinais como meras tentativas de chamar a atenção. E, muito por isso, ignoram os sinais. Ou, quando se dão conta do risco que eles anunciam, já é muito tarde e nada mais pode ser feito. Por isso essas ‘comunicações’ precisam sempre ser consideradas. Muitas vezes, elas podem conduzir para comportamentos impulsivos ou imaturos e, possivelmente, para o suicídio”.
– Para se ter uma ideia, os homens possuem mais chances de cometer suicídio do que mulheres. Os brasileiros, por exemplo, têm 3,7 vezes mais chances de se suicidar do que as brasileiras, de acordo com estudo realizado pelas pesquisadoras Daiane Borges Machado e Darci Neves dos Santos, da Universidade Federal da Bahia (UFBA). As possíveis razões para isso estão no fato de homens serem mais resistentes a procurar ajuda e utilizar métodos mais letais em suas tentativas – destaca Sônia.
Com relação ao preconceito que ainda existe quando o assunto é saúde mental, Prado explica que o mesmo pode ser “descrito como a manifestação de repúdio ou hostilidade em consequência de juízos pré-concebidos acerca de indivíduos, pensamentos e comportamentos”. Ou seja, ele nasce de generalizações e estereótipos que não costumam reter a realidade.
A saúde mental ganhou muito destaque nos últimos anos tanto na mídia quanto nas conversas casuais. A pandemia de coronavírus, sobretudo, levou muitas pessoas a questionarem os fatores necessários para cuidar da saúde mental. “Mas ainda por uma questão cultural e por falta de informações as pessoas preferem repudiar, julgar os comportamentos chamados de não adequados socialmente do que buscar formação sobre saúde mental e os processos de tratamento em casos de distúrbios e traumas”.
O que não deve ser feito quando há suspeita de que a pessoa pensa/planeja cometer suicídio?
A coordenadora do curso de Psicologia da Estácio São Paulo diz que o pensamento suicida aparece com uma frequência muito maior do que se imagina, pois nem sempre este pensamento é declarado as pessoas ao redor, talvez por medo de ser interpretado erroneamente pelas pessoas ou por não conseguir elaborar o assunto a ponto de colocar para fora e compartilhar com alguém.
– É importante esclarecer que nem sempre uma pessoa com pensamento suicida irá concretizar o ato. Quando percebemos alguém próximo com pensamentos suicidas, é importante não entrarmos em pânico, tente falar com essa pessoa de forma calma, demonstrando que ele é uma pessoa importante e querida por muitos, principalmente por você. Demonstre acolhimento, pois muitas vezes o pensamento suicida é uma forma de saber o quanto ele é importante e amado – explica Prado.
– E, com muito jeito e cautela, convide-o para que procure um terapeuta. Mostre a importância de uma orientação adequada, por um profissional tecnicamente preparado. Porém, é importante, que durante esse processo de encaminhamento, se certificar que ela não tenha acesso a meios para provocar a própria morte em casa como armas de fogo, pesticidas ou medicamentos – reforça a especialista.
O que são pensamentos suicidas?
Sônia explica que os pensamentos suicidas são considerados todos os pensamentos que um indivíduo tem sobre a intenção e o planejamento de tirar sua própria vida. “Esses pensamentos podem variar desde o mero desejo de morrer até a realização ativa de planos concretos para a implementação da autólise. Este último, no qual o sujeito elaborou como, onde e quando, é o mais perigoso e propenso a realizar o ato”.
– Enquanto os pensamentos e desejos a morte podem ocorrer em uma ocasião oportuna, normalmente quando falamos sobre tendência suicida ou pensamentos suicidas, geralmente nos referimos a um padrão de recorrência no qual o desejo de morrer aparece. Eles podem parecer meramente cognitivos, embora o mais comum seja que exista um certo desejo ou desejo em um nível emocional ou motivacional – complementa a professora.
Com distanciamento social obrigatório, o aumento de doenças relacionadas à saúde mental na população passou a ser recorrente, principalmente em quem já possuía fatores preexistentes.
– Mas, não temos dados concretos para afirmar que os pensamentos suicidas aumentaram durante a pandemia, o que sabemos é que foi um momento em que as pessoas tiveram, de certa forma, mais perto da morte e mais perto de si, o que pode ter aumentado a possibilidade de falar sobre vários assuntos como o suicídio. Esse pensamento sempre existiu, o que ocorreu foi a maior disponibilidade das pessoas falarem do assunto – conclui Prado.
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