Nova campanha do Maio Amarelo pede paz no trânsito

(Imagem: divulgação/Chico da Boleia)

Redação Chico da Boleia

Você sabe o que é o Maio Amarelo? É um movimento internacional de conscientização para redução de sinistros de trânsito, cujo objetivo é debater, junto a sociedade, temas importantes para garantir a segurança de motoristas, passageiros e pedestres. Com o tema “Paz no Trânsito Começa por Você”, em 2024 a iniciativa quer levar a todos uma reflexão sobre como seu comportamento, no dia a dia, pode afetar a vida das pessoas, principalmente, no trânsito.

A realidade é que, a cada ano que passa, a violência no trânsito aumenta. De acordo com dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF), ao longo de 2023 foram registrados 66.638 acidentes em rodovias, deixando um total de 59.148 feridos leves, 18.890 feridos graves e 5.615 mortos.

Ainda segundo a PRF, as principais causas dos sinistros são devido a reação tardia ou ineficiência do condutor, ausência de reação do mesmo, velocidade incompatível e ingestão de álcool por parte do motorista.

Um dos casos mais recentes de acidente de trânsito, envolveu Fernando Sastre de Andrade Filho, suspeito de matar Ornaldo da Silva Viana que, na ocasião, trabalhava como motorista de aplicativo. Fernando estava dirigindo um Porsche acima do limite permitido quando colidiu com o carro de Ornaldo. A polícia ainda investiga a possibilidade de Sastre ter ingerido bebida alcoólica antes de conduzir o veículo.

“Os sinistros de trânsito são multifatoriais, mas com uma participação decisiva importante do fator humano. O comportamento humano, a saúde do motorista, as condições laborais invariavelmente contribuem na dirigibilidade segura. Porém, é preciso que nós entendamos que essa questão também é multifatorial. Uma vez que os sinistros seguem acontecendo, seguem se repetindo, ou seja, existe uma previsibilidade da sua ocorrência. E a partir desse momento é preciso que os gestores, que os departamentos de engenharia de tráfego, com base nessas estatísticas e da constatação da existência desse ponto crítico, adotem as intervenções necessárias”, destaca Alysson Coimbra, coordenador nacional da Mobilização de Médicos e Psicólogos Especialistas em Tráfego.

O especialista ainda ressalta que existem determinadas ações que podem ajudar a combater, reduzir a quantidade de sinistros, seja investindo em melhorias na infraestrutura da malha viária, em readequação da sinalização, na adoção de instrumentos adicionais de fiscalização, de controle de fluxo e de velocidade, dentre outros.

O levantamento da Polícia Rodoviária Federal aponta também que os acidentes em rodovias ocorrem, majoritariamente, em trechos de retas, durante o dia e com boas condições meteorológicas (céu azul).

“Assim como o fator humano e o poder público, as vias concedidas à iniciativa privada, que têm a mesma responsabilidade dos governos e órgãos responsáveis em mitigar essas ocorrências que são repetitivas e sabidamente conhecidas, também precisam ser cobradas sobre a adoção dessas questões. Visto que, além dos impostos, todos os integrantes e todos os usuários desses trechos são cobrados por uma taxa de pedágio, que a gente tem que entender e torcer que seja muito mais do que somente para a conservação da qualidade asfáltica, mas para a intervenção, fazendo dessa rodovia segura”, analisa Coimbra.

Transporte Rodoviário de Cargas

Um levantamento do Instituto Paulista de Transporte de Cargas (IPTC) apontou que de somente nos dois primeiros meses de 2023 foram registrados quatro mil acidentes de trânsito envolvendo veículos de carga.

A análise dos veículos envolvidos revela que a maioria é composta por caminhão-trator (37%) e caminhonetes (30%). Os caminhões representam cerca de 25% dos casos, enquanto demais veículos como utilitários, camionetas e semireboques têm uma distribuição menor.

“O transporte rodoviário de cargas é hoje a grande realidade e o maior responsável pelo escoamento de produtos, de riquezas, de comodities em todas as regiões do nosso país. Esse transporte por si só é totalmente dependente do fator humano, uma vez que, por toda a tecnologia que exista, esses veículos seguem sendo conduzidos pelo homem e o homem é sujeito a erros, o homem é sujeito a intempéries, a intervenções do meio que ele vive. Sabemos de todas as dificuldades que estão associadas a essa atividade e que, consequentemente, repercutem na dirigibilidade desses condutores”, explica Alysson.

Para o especialista, no momento, o cenário é preocupante, pois a maioria dos motoristas está sobrecarregada, trabalhando e dirigindo mais do que os estudos garantem como uma condição de segurança mínima. “Temos jornadas diárias que ultrapassam 18 horas, resultando na privação intencional do sono, muitas vezes motivada pela necessidade de melhor remuneração (que não é pela privação do sono que será corrigida), entre outros fatores que tornam essas jornadas exaustivas. Cientificamente, a partir de 16 horas de condução do veículo, o motorista perde atenção, a concentração, o reflexo, o seu tempo de reação ele é aumentado, tendo como consequência, por muitas vezes, um acidente grave de trânsito”.

Inteligência artificial x condutores

Questionado sobre como as tecnologias embarcadas têm ajudado os transportadores a reduzir o número de sinistros nas estradas e rodovias, Coimbra ressalta que a inteligência artificial em caminhões ainda não é uma realidade para a maioria dos condutores das categorias C, D, e E. “Sabemos que mais de 70% desses motorista são autônomos e não possuem sequer uma condição de renda para garantir o sustento da sua família, uma mínima condição de manutenção preventiva dos veículos e muito menos para utilizarem tecnologias embarcadas”.

Para Alysson, tais iniciativas são louváveis e já aplicadas na iniciativa privada, fazendo a diferença para entender o comportamento do condutor, ajudando na redução de acidentes ao corrigir ações prejudiciais ao condutor e ao veículo. Entretanto, ainda está distante do ideal para garantir a segurança e qualidade no trabalho desses profissionais

“Um erro grave cometido por muitos motoristas é a condução do caminhão com apenas uma mão no volante. Nos veículos sem automação, a retirada da mão do volante deve ser realizada apenas para a utilização da transmissão das marchas. Nos caminhões com automação, qualquer ação como bocejo, inclinação da cabeça, expressões faciais que levam a monotonia, são sinais que a inteligência artificial utiliza para promover alguns alertas ou até mesmo um alarme que obriga esse condutor a imediatamente interromper a sua viagem. Então, são instrumentos valiosos, mas que infelizmente pelo alto custo, eles ainda não são uma realidade da maioria dos condutores do transporte remunerado de cargas e de passageiros do nosso país”.

O especialista reforça que a campanha do Maio Amarelo é mais uma oportunidade para que as empresas que, por meio da inteligência artificial, de recursos, de tecnologia, apresentem medidas que sejam acessíveis aos condutores autônomos, que seja acessível também às pessoas que mais necessitam, pois são as mesmas que estão morrendo, que estão ficando mutiladas. “Então, é um momento de se debater ideias, de se debater estatísticas e de receber e acolher medidas tecnológicas que sejam capazes de ajudar, quer seja no monitoramento, no processamento, na coleta desses dados ou até mesmo com tecnologias embarcadas, e que possam melhorar e garantir uma dirigibilidade segura”.

Maio Amarelo e o papel do poder público

Alysson destaca que o Maio Amarelo surgiu da necessidade de integrar todas as pessoas que estão envolvidas no sistema nacional de trânsito (usuários, sociedade civil, especialistas, gestores e autoridades voltadas para a segurança viária) para que seja um mês no qual se possa discutir com mais intensidade as possibilidades reais a curto e médio prazo para modificar o cenário atual.

“Estamos vivendo uma realidade assustadora nas ruas, estradas e rodovias do nosso país. A campanha de 2024 é marcada com um slogan que transmite para o usuário da via a responsabilidade de dirigir de maneira consciente para preservação da vida. A partir do momento que essas discussões são colocadas e que essas pessoas têm a oportunidade de sentar na mesma mesa de discussão e, momentaneamente, com posições iguais e equivalentes para apresentar as suas impressões, isso é determinante para sensibilizar, para cobrar também desses gestores medidas que possam efetivamente modificar esse cenário”, explica Coimbra.

“O slogan do Maio Amarelo reforça que a ‘paz começa por você’, tendo como um dos objetivos mostrar que já vivemos em um espaço coletivo, que é o trânsito, que foi indiscutivelmente o mais afetado nesse pós pandemia em relação à saúde mental e psicológica. E a partir do momento que o motorista está em paz e que ele deseja essa paz para o seu deslocamento, invariavelmente, ele não irá ter episódios de raiva, de fúria, que são o gatilho para agressões, lesões corporais e até mortes evitáveis em discussões em brigas, em uma clara inabilidade de uma convivência harmoniosa nesse ambiente coletivo”, conclui o especialista.

Comentarios