Norte apresenta tendência decrescente, mas Centro-Oeste está com curva em ascensão. Vírus está se espalhando no interior do país e dá sinais de ‘platô’ em metrópoles do Sudeste. Levantamento de consórcio de veículos de imprensa aponta que país tem 48.427 mortes
O Brasil chegou a 1 milhão de casos de coronavírus na tarde desta sexta-feira (19), mostra um boletim extra do levantamento feito pelo consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde.
Veja os dados atualizados às 14h no boletim extra desta sexta:
- 48.427 mortes
- 1.009.699 casos confirmados
Às 20h desta quinta-feira (18), o consórcio havia divulgado o 11º balanço, com os dados mais atualizados das secretarias estaduais naquele momento, indicando 47.869 mortes – sendo 1.204 em 24 horas – e 983.359 casos confirmados.
Desde então, AC, CE, DF, GO, MT, MS, MG, PE, RN, RR, SP e TO divulgaram novos dados.
Os dados foram obtidos após uma parceria inédita entre G1, O Globo, Extra, O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo e UOL, que passaram a trabalhar de forma colaborativa para reunir as informações necessárias nos 26 estados e no Distrito Federal.
O objetivo é que os brasileiros possam saber como está a evolução e o total de óbitos provocados pela Covid-19, além dos números consolidados de casos testados e com resultado positivo para o novo coronavírus.
Avanço mesmo com subnotificação
Embora elevados, os números de casos e de mortes estão subnotificados. O Brasil ainda faz, como apontou um especialista ouvido pelo G1, “brutalmente” menos testes para detectar a doença do que deveria: são tão poucos RT- PCR (exames laboratoriais ideais para diagnosticar a Covid-19), que o número de casos confirmados muitas vezes é secundário para cientistas que analisam a evolução da pandemia.
“O Brasil está testando brutalmente menos do que deveria. Na melhor das hipóteses, 20 vezes menos do que é considerado adequado”, afirmou ao G1 Daniel Lahr, professor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP).
O G1 ouviu especialistas de cada uma das regiões do país e traçou um panorama da situação que o Brasil enfrenta às vésperas do inverno, que começa oficialmente neste sábado (20). Veja abaixo:
Norte
Região com a menor quantidade de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e que sofre com taxas altas de ocupação, o Norte passou a apresentar uma curva descendente de notificações desde 10 de junho.
A média de registros diários na região ficou em 5.611 casos, sendo que os municípios mais afetados têm perto de 250 confirmações por dia. São eles:
- Porto Velho (RO) – 295
- Parauapebas (PA) – 269
- Macapá (AP) – 257
- Manaus (AM) – 236
- Belém (PA) – 198
Pedro Vasconcelos, professor da Universidade do Estado do Pará (Uepa) e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, diz que é cedo para comemorar: as movimentações recentes para abertura do comércio têm feito a população “andar onde quer e como quer”.
Marília Brasil, pesquisadora do núcleo de medicina tropical da Universidade Federal do Pará (UFPA) e infectologista especializada em saúde coletiva, explica que Belém, por exemplo, apresenta uma taxa de transmissão menor. Mas, no interior, observa-se uma elevação da taxa de contaminação.
“O Pará é muito irregular, ele é muito grande. Na capital, estamos mantendo uma taxa de transmissão abaixo de 1, mas na região metropolitana fica em 1,1. E, mais próximo do interior, nós temos 1,5. Tem áreas no Pará em que a taxa de reprodução está muito alta”, diz a médica.
De acordo com ela, a taxa de transmissão média pode mostrar uma tendência de queda ou de estabilização. Ela chama a atenção, no entanto, para áreas em que as tacas ainda estão em ascensão – caso de Santarém –, que precisam de um aumento das restrições.
Pedro Vasconcelos cita também a grande presença indígena em toda a região Amazônica. Ele chama atenção para o fato de os grupos viverem em comunidade, o que facilita a transmissão. Há mais de 6,3 mil indígenas contaminados no país, com foco no estado do Amazonas.
“Podemos ter um o background genético. Vimos casos de pessoas de uma mesma família, e várias morrerem. É preciso estudar isso, o que demanda tempo. Não é uma coisa para fazer da noite para o dia. Precisamos de estudos virológicos e também da área da genética”, disse.
Nordeste
Os números de Covid-19 continuam altos no Nordeste – e não há tendência de melhora –, afirma o professor de epidemiologia computacional Jones Albuquerque, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).
Albuquerque explica que todos os estados aparecem em vermelho nos gráficos usados no laboratório da UFPE. As tabelas levam em consideração o número de infectados, a taxa de contágio e o número de casos para cada 100 mil habitantes.
José Luiz de Lima Filho, médico e professor também nas universidades federais de Pernambuco, afirma: “As cidades do interior não têm a mesma infraestrutura. Então, os casos acabam vindo para a capital. Havia a esperança de que, no interior, as pessoas ficassem mais espaçadas [distantes umas das outras], mas não é isso que está acontecendo”.
Lima Filho explica que Recife, por exemplo, conseguiu ampliar o número de leitos de UTI, assim como o Ceará. Segundo ele, no entanto, o mesmo não ocorreu em outras cidades, como Natal.
O Nordeste tem um risco adicional nesta época do ano: as arboviroses (dengue, zika, e chikungunya).
Lima Filho ressalta também que não se sabe o que pode acontecer caso as pessoas sejam infectadas, ao mesmo tempo, por Covid-19 e alguma arbovirose.
Ricardo Lustosa, professor do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA), explica que, com a chegada da estação em que há maior incidência de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) no Nordeste, o temor é que a população se torne mais vulnerável ao coronavírus.
“Se, concomitante à Covid, o cidadão estiver com sistema imune e respiratório em déficit, por SRAG, o corpo terá mais desafios, maior dificuldade de combater o vírus, podendo ampliar a procura [por serviços médicos] e a necessidade de internações e [provocar] sobrecarga do sistema de saúde, bem como das UTIs”, descreve.
Centro-Oeste
O Centro-Oeste está com a curva de casos em ascensão. Em 14 de junho, a média dos casos confirmados ficou em 1.630. Nesta quinta-feira (18), foram 2.482 casos no Centro-Oeste do país. Brasília é a cidade mais afetada, com 1.145 confirmações em média. Depois: Goiânia (225), Rio Verde (236) Dourados (89) e Cuiabá (79).
De acordo com Marcelo Gomes, do monitoramento do dados da Fundação Oswaldo Cruz, o Infogripe, a região tem um ciclo das doenças respiratórias diferente de outros lugares do Brasil.
“Ela acaba ficando no meio do caminho. Quando tem um surto forte no começo do ano na regional Norte, isso muitas vezes também acaba fazendo com que o padrão da regional centro também seja mais cedo”, explica Gomes.
Para José David Urbaéz, diretor-científico da Sociedade Brasileira de Infectologia no Distrito Federal (SBI-DF), a situação está se agravando agora, segundo ele, porque ocorreu um relaxamento nas normas de isolamento social há cerca de 2 semanas, no início de junho.
“Coincidentemente, Brasília e Goiânia tiveram uma política de isolamento social bem precoce. Brasília fechou as escolas em março e Goiânia teve uma política de fechamento logo na primeira semana dos casos”.
“Desde o início de junho, algumas coisas que foram abertas em toda a região Centro-Oeste. Goiás abriu um pouco antes, na segunda quinzena de maio”.
“O vírus entra pelas áreas de classe alta, porque a nossa epidemia foi importada, e enquanto tem o isolamento horizontal você interrompe. Mas a massa que se movimenta para as regiões centrais continua transmitindo”, completou.
Sudeste
O Sudeste registrou os primeiros casos da pandemia no Brasil em março deste ano, mais especificamente na cidade de São Paulo. Desde 16 de junho, a região está em um aparente platô – uma estabilização da curva, sem uma queda ou uma alta nos registros da doença. A média dos últimos 7 dias está em 7.887 casos confirmados.
A cidade de São Paulo continua com a média mais elevada por dia (2.208), seguida pelo Rio de Janeiro (891). Os outros 3 municípios mais afetados têm perto de 184 confirmações diárias: Santos (202), Vila Velha (180) e Vitória (171).
Paulo Lotufo, epidemiologista da Faculdade de Medicina da USP, avalia que é difícil fazer previsões para o estado de São Paulo. Na capital, por exemplo, há de fato esta estabilização (platô), mas a abertura econômica deve facilitar o aumento de casos – mesma previsão feita pelos especialistas também para a região Norte.
“O platô existe, e a tendência em São Paulo seria de diminuir, mas não é possível afirmar nada. Uma questão que existe é que a capital é muito dinâmica. A quantidade de sacoleiros que vêm comprar coisas no Brás, na 25 de março, é imensa – e eles são de outros lugares”, lembra.
Outro fator que torna as próximas semanas incertas é a cobertura vacinal para os vírus Influenza, assim como a efetividade da vacina, que muda todo ano, explica o epidemiologista.
Conforme as séries históricas da Fiocruz, o estado vive agora a época de maior circulação dos vírus respiratórios, que deve durar até o início de agosto. Mas esse padrão não necessariamente vai se manter para o Sars-CoV-2.
Sul
A infectologista Lessandra Michelin, professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), no Rio Grande do Sul, afirma que ainda há dúvidas sobre os próximos meses para a região.
Segundo as séries históricas da Fiocruz, a época de maior incidência de SRAG na região Sul segue o mesmo padrão de São Paulo e Minas Gerais: começa no fim de maio e termina no início de agosto.
Michelin explica que, com as medidas de restrição adotadas em março, a população do Sul demorou a ser exposta ao vírus. Depois da primeiras aberturas, a partir da segunda quinzena de maio, os casos aumentaram.
Os inquéritos sorológicos (pesquisas feitas para descobrir quem foi exposto ao vírus conforme os anticorpos produzidos pelo corpo) já atestam o crescimento, afirma a médica. O receio, agora, é com uma possível sobrecarga do sistema de saúde, principalmente o público.
“Com algumas exceções, é principalmente o sistema público que está mais sobrecarregado. O sistema de saúde suplementar tem notado um aumento, mas não é tão significativo. A gente tem receio que o SUS seja muito sobrecarregado”, diz.
“Se aumentar o número de casos e sobrecarregar o sistema de saúde, a gente inevitavelmente vai para um lockdown de novo, e a gente não quer isso”.
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