Depois de sofrer com a violenta retração do mercado de veículos, a empresa contra-ataca com um investimento de R$ 2,6 bilhões. A ordem é pensar menos em caminhão e mais em tecnologia
Em março do ano passado, o paulista Roberto Barral recebeu a grande promoção de sua vida. Após 22 anos trabalhando na montadora sueca Scania, onde começou como trainee na fábrica de São Bernardo do Campo e chegou a ocupar posições de liderança em países como Portugal e Espanha, ele foi alçado ao cargo de diretor geral da companhia no Brasil. Apesar da importância da nova função e de um ordenado mais recheado no fim do mês, Barral assumiu o comando em um dos momentos mais conturbados da história do setor de caminhões no Brasil.
De 2013 a 2016, a produção despencou 67%, para 60,5 mil veículos produzidos no ano passado. A despeito desse cenário desanimador, Barral terá R$ 2,6 bilhões para investir nos próximos três anos. “Sempre pensamos no longo prazo”, diz ele. “Estamos aqui há sessenta anos e já planejamos os outros sessenta.” Segundo o executivo, grande parte desse aporte vai para a área de tecnologia. “A crise acelerou processos e os clientes estão à procura de soluções, não somente de um caminhão.”
Mais do que nunca, a Scania quer ser considerada uma empresa de tecnologia. Não à toa, Barral comemorou e muito um dado do primeiro trimestre deste ano: a Scania implementou seu programa de gestão de frota, chamado de Serviços Conectados, em mil caminhões. A meta era chegar a esse número somente no fim de 2017. “Mostramos ao cliente que ele consegue ganhar dinheiro com o nosso programa”, diz Alex Barucco, gerente do Serviços Conectados da Scania. De acordo com a empresa, é possível economizar ao aderir ao sistema.
Isso porque o programa organiza dados como estilo de condução do motorista, velocidade média, consumo do combustível e intervalos de manutenção, e os envia para o responsável pela frota. Com essas informações, é possível educar os motoristas, fazer gestão da frota e ter ganhos de produtividade. “É uma espécie de ‘Big Brother’ do caminhão”, diz Barral. Segundo a Scania, a transportadora de TNT foi um dos clientes do Serviços Conectados e, em poucos meses, conseguiu alcançar uma economia de 10% no combustível de sua frota de 80 caminhões.
Para acelerar o processo de automatização dos caminhões novos e usados, a Scania espera despender parte dos R$ 2,6 bilhões na modernização da planta de São Bernardo do Campo e no marketing para agregar donos de caminhões antigos. A ideia é mostrar os benefícios da automatização para os donos, que pagam até R$ 200 por mês por cada veículo automatizado. Além da tecnologia, outro ponto que tem sido importante para o faturamento da empresa não cair na mesma velocidade que o mercado é a exportação.
A companhia tem conseguido manter parte de sua fábrica funcionando para enviar caminhões para outros continentes como Ásia, África e a própria América Latina. “Temos no Brasil uma planta tão moderna quanto a da Suécia”, diz Barral. Por isso, a companhia também vem produzindo o motor Euro 6 localmente desde o ano passado. Trata-se do motor com o mais rígido controle de poluentes do mundo e que tem a Europa como principal destino. Além dos investimentos na tecnologia, a empresa também vai aumentar a sua rede de concessionárias.
Até 2020, Barral espera contar com 140 revendedores, um aumento de 17 lojas. É uma forma de tentar se aproximar das líderes do setor. No fim do ano passado, a Scania fechou na quinta posição, com 4,2 mil caminhões vendidos e 8,44% de participação. A queda de 18,74% em relação a 2015 foi a menor registrada pelas cinco primeiras colocadas, mas ainda a deixa distante das líderes Mercedes e MAN, com 30% e 27,2% de fatia de mercado, respectivamente.
Para esse ano, a expectativa da Scania é um crescer 15% e se consolidar na quarta colocação no mercado, conquistada neste primeiro trimestre – com uma diferença de apenas 27 veículos para a conterrânea Volvo. “O setor chegou ao fundo do poço e estamos nos recuperando”, diz Barral. O mercado acompanha a expectativa, mas fala em uma alta de 5% a 6% em 2017. “A retomada do setor dos caminhões depende do crescimento do PIB e da queda dos juros”, diz Luiz Carlos de Moraes, vice-presidente da Anfavea. É o que espera Barral, para, finalmente, poder comandar a Scania sem pensar na palavra crise.
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